sexta-feira, 25 de novembro de 2011

Pré - Estreia

Quinta, 21 de Janeiro de 1993

    Aconteceu uma coisa muito, muito boa! O Marco me ligou chamando pra ir ao cinema amanhã. A Renata estava aqui na hora e disse que a gente vai acabar namorando. Não sei o que vai acontecer, e não quero ficar pensando nisso, só quero pensar que amanhã eu vou ao cinema com ele. Nunca fui ao cinema com um garoto, a Renata e a Bel já foram e eu confesso que sentia uma pontinha de inveja delas, mas agora é minha vez... estou animada e nervosa também.
     Diário, não fiz nada demais esses dias, estou me alongando, praticando uma hora na barra pra não voltar ao Ballet enferrujada e lendo muito. Estou apaixonada pelos meninos que moram em um trapiche e roubam pra sobreviver: Professor (um desenhista como um dia eu quero ser), o Gato, Volta Seca, Pirulito, João grande, Dora e principalmente por Pedro Bala, o menino bandido, lindo e corajoso líder dos Capitães de Areia.
    Minha mãe contou que também leu esse livro, quando era adolescente, só que ele era considerado imoral e teve de ler escondido. Ela estudou em um colégio de freiras super rigoroso (que tédio!).
      Ela disse que até hoje a minha avó não gosta de Jorge Amado, porque ele escreve muito sobre sexo, e que não é pra eu comentar do livro. Claro que eu não vou comentar, primeiro porque nem estamos nos falando e depois porque a última coisa que eu quero é a senhora L me passando sermão.
     Acho uma pena ela não gostar de Jorge Amado, ele escreve sobre sexo porque isso faz parte da vida dos meninos de rua, não tem nada demais, e pelo que eu li até agora é um escritor incrível. Fico feliz que as coisas tenham mudado e eu possa ler esse livro tranquila, no meu quarto, e comentar com os meus pais.
     Vou parar por aqui e ler um pouco mais pra ajudar o tempo a passar... o dia de amanhã vai demorar uma eternidade...


sábado, 19 de novembro de 2011

Festa em "Thundera"

Domingo, 17 de Janeiro de 1993

   Hoje a tarde nós fomos nadar na casa do Mun-há, porque ele não está podendo sair. Assim que nós chegamos a Renata quase me mata de vergonha porque perguntou pra mãe dele se o Mun-há estava  em casa. mulher ficou branca, mas foi educada e nos convidou pra entrar. Agora me diz que mãe gostaria de ter um filho com o apelido de uma múmia nojenta dos Thunder Cats? O Mun-há se chama Marcelo, ele ganhou esse apelido porque têm uma voz grossa e rouca. Não foi a gente que colocou o apelido, mas se eu fosse a mãe dele também não ia querer saber disso, só ia detestar que chamassem meu filho assim. Queria um buraco pra enfiar minha cara.    
      Mas tirando o King Kong da Renata (e a minha crise nervosa no banheiro por ter de usar biquíni) o dia foi ótimo, nós nadamos, ficamos derrubando uns aos outros das boias, assistimos um DVD de luta livre. Os garotos estavam loucos pra jogar, mas como o vídeo game está vetado pro Mun-há,  eles se distraíram com a pancadaria real. 
     Eu fiquei um tempo com eles, mas preferi tomar sol com a Bel. A Sisa continuou lá, perto do Paulo e a Renata foi conversar com o Henrique. Tem horas que ela é tão oferecida que me dá raiva. Ele estava, com dois amigos, do outro lado da piscina e assim mesmo a boba foi lá atrás dele. Depois briguei com ela, disse que não é legal se jogar assim pra cima dos meninos, mas ela nem ligou e jurou que ainda vai beijar ele. Eu preferia beijar um ele deve ser mais simpático.     
     Mas o melhor de tudo é que o Marco foi. Ele tinha saído com os pais e chegou no final da tarde com o primo, o Teo, que a Bel achou fofo. Fofo é o Marco, assim que ele me viu me deu um sorriso que me deixou zonza. Depois nos fomos lanchar e ficou todo mundo na sala ouvindo música, comendo e conversando. Meu coração quase parou quando ele pegou na minha mão e fez carinho no meu cabelo. Diário é tão bom ficar com ele, (sei que eu sou uma tonta romântica) mas eu me sinto muito feliz!  
    Só saímos de lá as oito quando a, irmã da Renata, a Rebeca chegou pra buscar a gente. A Rebeca me viu beijando o Marco, mas não tem problema, ela é legal e não vai contar pros meus pais. O Marco falou pra gente combinar de ir ao boliche ou a sinuca no final de semana que vem, acho que com muito choro meus pais acabam deixando. 





O Perfume

Sábado, 16 de Janeiro de 1993

    Diário, ontem ganhei uma porção de presentes legais e um da minha avó que chegou pelo correio, uma caixa de Chanel 19. Sempre quis usar o perfume dela o Chanel  5, mas ela diz que não é perfume pra meninas e agora me mandou esse. 
   O perfume é maravilhoso, só que ele chegou sem nenhum cartão de aniversário, nem mesmo um com duas palavras. Fiquei triste, se ela fez isso pra mostrar que está chateada comigo, então seria melhor não ter mandado nada. Pra que enviar um presente de aniversário se não vai dar um telefonema ou mandar um cartão?
     Minha mãe disse que eu estou sendo ingrata e que eu só vejo o meu lado da história. Não é ingratidão, é que eu não consigo entender... sei que tudo isso é porque eu não quis um baile de debutante, o que é totalmente injusto. Amo minha avó, mas também a detesto. Eu nunca disse isso (e me sinto culpada), mas realmente detesto o autoritarismo dela, detesto esse jeito  de querer decidir tudo por todo mundo. Sei que provavelmente nunca vou dizer isso a ela, mas a minha vontade é de pegar o telefone e falar tudo que está entalado na minha garganta há bastante tempo.


Morte as debutantes

Sexta, 15  de Janeiro de 1993
     
    Hoje a noite fui com meus pais e amigos a Pizzaria. O lugar é bem bonito e confortável, ao todo foram 16 pessoas, até o Mun-há deu um jeito de ir e claro o Marco. Ele estava lindo de camisa azul e super sem graça por causa dos meus pais. Eu também fiquei com coração na boca, mas ninguém deu bandeira e aos poucos fui me acalmando.
   Foi muito divertido, nós comemos demais, ficamos lembrando das histórias do colégio e o pessoal cantou parabéns pra mim no meio da pizzaria, fiquei vermelha, mas adorei. 
   Meus pais também gostaram fiquei com medo deles se sentirem deslocados, mas a mãe da Sisa e os pais da Renata foram e acho que eles se divertiram.
   Ah e o segredo é que ganhei um beijo de aniversário (segredo pros meus pais). Na hora que o Paulo e o Marco estavam indo embora, fui acompanhar eles até a porta e ele me beijou. Fiquei gelada com medo dos meus pais aparecerem, mas foi muito bom.
     Essa noite foi exatamente como eu queria. Passei o meu niver em um lugar legal com a minha família e os meus amigos e ainda ganhei um beijo do menino que eu gosto, sem precisar de baile, salto, valsa e mais um monte de formalidades que não tem nada haver comigo. E quer saber? Tenho certeza que me diverti muito mais que meia dúzia de debutantes juntas. 

O meu coração é um músculo involuntário e ele pulsa por você. Um dia eu vou estar contigo e você vai estar na minha.

Quinta, 14 de Janeiro de 1993

     Ontem fui na Galeria patinar com os meus amigos, todo mundo menos o Mun-há, por causa do castigo. A Renata chamou o Alessandro, o menino com quem ela está ficando e ele foi. Queria chamar o Marco, mas não tive coragem de ligar pra ele, só que mesmo assim foi muito divertido. Adoro patinar, teve uma hora que o Jaques e eu estávamos patinando rápido demais e demos uma topada engraçadíssima (eu sai derrapando pela pista), foi legal, mas agora estou toda dolorida e com o joelho roxo.


     Hoje a tarde fui com comprar uma roupa pra amanhã. Não comprei nada demais, só uma calça jeans escura e a minha mãe me convenceu a levar uma blusa preta decotada, espero ter coragem de usar.
      A noite telefonei pro pessoal pra confirmar a pizzaria e finalmente criei coragem e liguei pro Marco. Minhas mãos tremiam tanto que eu custava a segurar o telefone e quando ele atendeu engasguei horrores. Ele disse que vai, mas apesar de feliz eu também queria morrer (é insuperável a minha capacidade de fazer papel de boba). Nos continuamos conversando e, ainda bem, que aos poucos eu consegui dizer algo que fizesse sentido. 

sexta-feira, 18 de novembro de 2011

Beija eu

Domingo, 10 de Janeiro de 1993

"A humanidade é desumana. Mas ainda temos chance, o sol nasce pra todos, só não sabe quem não quer" 
                                                                    (Legião)


     Passei a tarde com as minhas amigas, andamos de bicicleta, fomos a sorveteria e depois ficamos na Renata ouvindo Cazuza. A Sisa não foi à festa e queria saber todas as novidades, ela reclamou que agora é a única que ainda não beijou ninguém, mas ela ainda vai fazer quatorze anos é diferente. Espero que a Sisa fique com o Paulo, ela é louca por ele e é muito bom ficar com quem a gente gosta.
  Enquanto estávamos lá de bobeira o Mun-há ligou, ele bebeu todas ontem, vomitou no sofá da mãe e o pior os pais dele viram, ele se fu... legal, os dois estão furiosos e ele de castigo, sem tv, computador, etc, etc. 
     Pra completar ele brigou com o irmão. O Henrique também levou bronca porque deixou ele beber e foi descontar no Mun-há. Não consigo mesmo ir com a cara desse garoto, ontem ele estava na festa com a Patrícia, uma menina chatinha do colégio, e achei os dois um par perfeito (barbie e Ken do mal).
       Última coisa, contei pras meninas o que o Marco falou do meu beijo e a Renata ficou me sacaneando, dizendo que tem gente que já nasce sabendo, mas o melhor foi a Bel contar que o menino com quem ela ficou não colocava de jeito nenhum a língua dentro da boca dela, rimos muito. 


quinta-feira, 17 de novembro de 2011

"Quantos caminhos até chegar a um beijo"

     Sábado, 09  de Janeiro de 1993

   Diário aconteceu. Eu fiquei com o Marco. Eu dei meu primeiro beijo! Estou feliz como eu pensei que ia ficar, mas também me sentindo meio estranha... 
    Hoje passei à tarde no salão com as meninas e a noite coloquei um vestido azul que eu comprei pra festa, umas sandálias de salto (passei a semana praticando com elas pelo apartamento pra não dar vexame) e depois de muito choro e, várias negociações, meus pais me deixaram voltar à uma da manhã com a Renata e pai dela. 

     A festa estava incrível. A casa da Thais é enorme, eles montaram a pista de dança ao lado da piscina, tinham dois DJs tocando e eu dancei muito. A Thais estava linda e super simpática, ela convidou uma galera do colégio e o melhor de tudo meia-hora depois o Marco chegou também.
   Ele e o Paulo vieram conversar com a gente e ficaram o tempo todo por perto.          
     A única coisa chata é que toda vez que eles iam buscar bebida ou conversar com alguém os meus amigos começavam a me zoar, o que não ajudava e só me deixava mais nervosa.
     Eu queria ficar com ele sem que ninguém forçasse nada e ainda bem que foi o que aconteceu.
Estávamos dançando e de repente ele me chamou pra dar uma volta. Nós sentamos em um dos bancos do jardim e ficamos conversando, minhas mãos tremiam e meu coração batia tão depressa que eu tinha a impressão de que ele podia ouvir. O beijo foi estranho e bom. Estranho porque foi mesmo... bem... engraçado  (desculpa a falta de vocabulário) sentir outra língua na minha boca e o meu estômago dando voltas e mais voltas. E bom porque eu sonhei muito com isso, em sentir ele me abraçar, me beijar e agora aconteceu de verdade.
     Quando nós voltamos de mãos dadas, aí o pessoal zoou mesmo, fiquei com vergonha, mas também feliz. Ficamos juntos até a hora de ir embora (minha hora de ir embora, é claro...) e foi muito bom! Pena que a meia noite e meia (meia hora depois da Cinderela) eu virei abobora e tive de voltar pra casa.
     Agora são cinco horas, o dia está quase amanhecendo e eu não consegui dormir. Ouvi música, vi tv, tentei ler, mas principalmente lembrei do Marco. Sei que estou sendo boba e romântica, mas está foi a primeira vez em que eu fiquei até mais tarde em uma festa. A festa em que eu dei o meu primeiro beijo, então não vou me importar... acho que eu posso ficar bem velinha, mas não vou esquecer dessa noite.
     Ah aconteceu uma coisa engraçada, depois que o Marco me beijou ele disse que eu tenho um beijo muito gostoso. Não entendi nada, ele já beijou uma porção de meninas, achei que ele ia saber na hora que era o meu primeiro beijo, mas parece que ele não percebeu. Que bom, não quero que ele saiba nunca, ia morrer de vergonha.
     Vou tentar dormir, beijos na boca.

A vida é muito bonita,
basta um beijo
e a delicada engrenagem movimenta-se,
uma necessidade cósmica nos protege.”
Adélia Prado.




Com quem você quer falar por horas e horas e horas

Sexta, 08 de Janeiro de  1993


     Hoje aconteceu uma coisa ruim e outra muito boa. A ruim é que meus pais tiraram o dia pra pegar no meu pé, (só pra não perder o hábito) eles falaram que eu só quero ficar na rua e que quando as aulas começarem isso vai ter que mudar.  Foi tão injusto que eu fiquei sem palavras. Essas férias estão sendo um porre, eu não estou fazendo nada legal e aí no único dia que eu faço alguma coisa divertida com os meus amigos eles reclamam.
     A verdade é que eles são muito machistas, (meu pai e minha mãe também!) acho que eles têm medo de que eu faça alguma besteira na rua e por isso querem me manter em casa o tempo todo. Tem horas que eu me sinto sufocada, não sei se isso é medo de que eu fique com alguém, só sei que eles regulam tudo: o horário que eu chego em casa, aonde eu vou, com quem eu falei ao telefone, é um saco. Se eles soubessem como a minha vida amorosa é inexistente, ou acreditassem nisso, será que iam ficar com dó de mim ou muito felizes? O triste é que estou mais pra segunda opção.
     Mas agora vamos a boa notícia, depois do sermão, o Marco ligou. Nem acreditei quando percebi que era ele, meu rosto ficou muito quente e tenho certeza que entrei no meu modelo rabanete. Diário foi tão legal, nós conversamos sobre mil coisas, ele me contou da viagem, perguntou se eu vou à festa da Thaís e o melhor de tudo, antes de desligar disse que está com saudade. Respondi que também estou com saudade, mas a verdade é que eu estou morrendo de saudade, estou louca pra ver ele e queria muito, muito ficar com ele.
     Depois liguei pra Renata e ela começou a gritar do outro lado do telefone e disse que de amanhã não passa. Não sei, tenho minhas dúvidas... o Marco tinha me ligado duas vezes até hoje, mas só pra ver coisas do colégio, nunca apenas pra conversar. Será que isso mostra que ele está afim de mim? Ou simplesmente é saudade de uma amiga? E agora como eu devo agir na festa? Devo ficar na minha e tratar ele só como amiga? E se ele pensar que não estou querendo fica com ele? Não sei, não sei de nada, minha cabeça está rodando, preciso conversar com a Bel e a Renata, mas vou ter que esperar até amanhã, vou tentar dormir, só não sei se eu vou conseguir... boa noite.

Drácula e Mc Donald's


Quinta, 07 de Janeiro de 1993

     Hoje meu dia foi muito legal, fui ao shopping com a Bel, Renata, Luana, Mun-há e Jaques ver Drácula de Bram Stoker. Eu estava louca pra assistir esse filme, li o livro o ano passado e embora o começo tenha sido chato depois eu fiquei completamente ligada na história. 
     Eu simplesmente adorei o filme, ele é tenso, sombrio, assustador, erótico... depois nós ficamos horas falando da história, as meninas dizendo como o Keanu Reeves é gato. Concordo, mas pra ser sincera preferia o Drácula, rejuvenescido, invadindo meu quarto, como ele fez com Mina (ai, ai). 
     Depois do cinema nós fomos pro Mc Donald’s e acabamos encontrando com o Rico, o Paulo e o irmão mais velho do Mun-há, o Henrique (ou o loirão como a Renata diz), ela acha ele lindo e vive babando o ovo dele. O garoto é mesmo bonito, mas tão pretensioso e pedante que me dá nos nervos. Pra você ter idéia ele nem veio conversar com a gente, só deu um tchauzinho de longe. As meninas é que foram lá falar com ele e eu preferi ficar na mesa com o Jaques, porque a conversa estava boa e não valia a caminhada. A grande novidade é que elas voltaram contando que o Marco chegou e deve ir a festa da Thais, meu estômago afundou de nervosismo, ansiedade, mas também de felicidade. Quero ir bem bonita, mesmo que não aconteça nada, se ele for eu já vou ficar feliz.









Um dia de Domingo

   Domingo, 03 de Janeiro de  1993

     O meu domingo foi bem típico. De manhã fui com a minha mãe ao clube. Lá ela encontrou a Ro, uma amiga dela, e eu a Renata e a Bel, joguei vôlei com elas e mais umas meninas e depois nadamos e tomamos sol.


     A noite fiquei embaixo do bloco conversando com o pessoal e depois no quarto lendo e ouvindo música. Estou morrendo de saudade do Marco, ele foi pra São Paulo no início das férias, mas disse que voltava na primeira semana de janeiro. Espero que sim, quero muito que ele vá ao aniversário da Thais.
      A Thais é uma amiga da Luana que faz dezesseis anos nesse sábado e vai dar uma big festa. A gente mal conversa e nem pensei que seria convidada, acho que ela só me convidou por causa da Luana, mas por mim tudo bem. O que importa é que o Marco é muito amigo do irmão da Thais, e que se tiver voltado com certeza ele vai. Estou torcendo, torcendo muito...



Réveillon 93

Sexta, 01 de Janeiro de 1993



Minha noite de réveillon foi definitivamente deprimente. Passei em um restaurante com meus pais, minha avó, o “amigo” dela e alguns amigos deles. O restaurante é ótimo, só que não tinha ninguém da minha idade pra conversar. Até aí tudo bem, eu gosto de conversar com pessoas mais velhas, o problema é que os assuntos deles eram tão chatos que eu fiquei deslocada. 
Queria ter ido pro Jockey, com a Renata, mas meus pais não deixaram, disseram que era um absurdo não comemorar com a minha avó, que eu valorizo mais meus amigos que a minha família, deram um show...
     A noite só não foi pior porque tinha um menino lindo na mesa ao lado, que não parava de me olhar, mas é claro que a tonta aqui com pai, mãe, avó e mais um monte de estranhos na mesa morria de vergonha de olhar pra ele.
     Detesto ser tímida, toda vez que eu fico com vergonha é como se ligassem um holofote bem na minha cara. Fico igual um rabanete e todo mundo começa a dizer: “Que bonitinho ela está vermelha”... quero sumir. E quando vou conversar com alguém e me dá branco? E quando eu engasgo e acabo fazendo papel de boba? É deprimente!
     Se eu continuar desse jeito nunca vou ficar com ninguém. Tenho quatorze anos, quase quinze e todas as amigas da minha idade já beijaram, menos eu. Me sinto um idiota por causa disso, fico me achando feia, gorda, sem graça. Minhas amigas dizem que não é nada disso e que o Marco, o menino que eu gosto, é a fim de ficar comigo, só que eu acho difícil de acreditar. Tem horas que ele me olha de um jeito que eu penso que é verdade, mas cinco minutos depois é como se ele só me quisesse como amiga, fico totalmente confusa.
     Sei que isso não é o fim do mundo e que comparado a crise econômica no Brasil ou a criação das repúblicas Checa e Eslóvaquia os meus dramas adolescentes não tem a menor importância. Mas já que resolvi contar a minha história e não um conto de ficção (coisa que pretendo fazer um dia) correrei o risco de ser boba e irrelevante. Pois apesar do fato de eu ser total e completamente virgem não ter a menor importância pra mais ninguém, ele tem toda a importância do mundo pra mim.


Não se incomode. O que a gente pode, pode. O que a gente não pode, explodirá.

Sábado, 02  de Janeiro  de 1993

     Continuando o diário das lamentações (que ao menos deve ser menos úmido que o murro) meu dia de hoje também não foi dos melhores. Minha avó veio almoçar aqui com o chato do Gilmar e eles voltaram a falar sobre o meu aniversário, foi ridículo. Minha avó não se conforma porque eu não quero um baile de quinze anos e simplesmente não para de falar sobre isso. É enlouquecedor! Já disse mil vezes que prefiro sair com os meus amigos, já agradeci educadamente, já expliquei pra minha avó que esse é um desejo dela não meu (o que só fez as coisas piorarem...) agora estou em “greve” de silêncio, eles falam, falam e eu fico calada.
     O problema da minha avó é que ela não aceita ser contrariada. A verdade é que a grande senhora L está tão acostumada a mandar em todo mundo, a controlar todo mundo que não consegue engolir um não. É duro dizer, mas a minha avó sempre mandou em mim também. Primeiro porque eu era muito criança e não entendia direito as coisas, depois porque eu não tinha coragem de dizer não pra ela, mas agora eu tive. Pela primeira vez eu disse NÃO! Você entende o quanto isso foi inédito? Eu disse NÃO pra minha avó e não vou voltar atrás. 
Será que ela é tão cega que não percebe que esse é o sonho dela? Eu só quero ir a pizzaria com os meus amigos, sem essa coisa toda de baile, vestido, valsa que não tem nada haver comigo. Não entendo toda essa empolgação com baile de quinze anos, é só um aniversário, uma data como outra qualquer e não é isso que vai mudar a minha vida. 
Depois que minha avó foi embora a minha mãe disse que eu sei como ser desagradável e ficou me passando sermão. Meu pai até tentou me defender só que aí ela começou a discutir com ele (tudo que eu precisava pra melhorar meu dia...) e me fez fugir pro quarto e pros meus livros, muito mais interessantes.
     Minha mãe diz que eu sou uma piralha mimada, é ofensivo, mas eu até entendo. Sei que eu não vivi quase nada e tenho muito que aprender, o que ela não quer ver e eu não posso dizer (pra não apanhar...) é que a minha avó, nessa história, está sendo tão piralha quanto eu e ainda mais mimada.






quarta-feira, 16 de novembro de 2011

Prólogo para um diário

   
     O que leva uma pessoa a escrever um diário? Talvez ela tenha uma vida extraordinária e queira registrar isso. Quem sabe ela seja simplesmente egocêntrica e esse seja seu tema favorito, ou ela se sinta tão só, tão profundamente só que precise de alguma forma fazer companhia a si mesma. Como alguém que conversa com o próprio reflexo no espelho...
     Eu não tenho uma vida extraordinária, minha vida na verdade é bem ordinária e nem sou tão egocêntrica assim, mas sou sim uma menina que se sente estranha e solitária, que muitas vezes tem medo dos outros e de si mesma e que busca respostas e companhia.
     Acho que vai ser bom escrever um diário, embora algumas pessoas (como meu amigo Jaques) possam dizer que é algo bobo e inútil. Bem eu tenho quatorze anos... então dizerem que eu faço coisas inúteis não é nenhuma novidade... eu prefiro imaginar que um diário é um tipo de amigo que apenas te ouve e o melhor nunca te critica ou sai contando os seus segredos por aí.
     O certo é que não vou chamar meu diário de “querido", ou algo parecido, não sou tão melosa assim, mas já que resolvi entrar nessa de amigo imaginário (outro comentário infame do Jaques) vou procurar ser sempre o mais sincera possível e escondê-lo dos olhos do mundo (entenda-se dos meus pais). Pois embora o Jaques tenha me zoado contando que as crianças deixam de ter amigos imaginários aos sete anos eu definitivamente preciso de um.